Nota do prof. Rogério Haesbaert sobre os ataques digitais ocorridos
Neste nosso dia do geógrafo, em outros tempos, teríamos mais o que comemorar. Hoje, infelizmente, nossa Geografia mais engajada e comprometida com a transformação social está sendo atacada. Dentro de uma crise de múltiplas faces – sanitária, política, econômica e de valores – não ficaríamos imunes. Nosso histórico comprometimento social se manifesta, pelo menos, desde o simbólico retorno do exílio de Milton Santos, no início da chamada abertura política durante a ditadura militar. Entre seus representantes mais dignos temos hoje colegas como Ariovaldo Umbelino de Oliveira e Carlos Walter Porto-Gonçalves. Pois foram justamente Ariovaldo, incansável na luta pela justiça social no campo e a denúncia à grilagem, e Carlos Walter, profundamente engajado com diversos movimentos sociais na América Latina, que tiveram nesta semana suas falas interrompidas por aqueles que, politicamente organizados ou não, se julgam autorizados a calar o outro e impedir a livre expressão do pensamento.
Vivemos tempos muito difíceis. Para quem, como eu, viveu a era sombria da ditadura sob as mentiras do “Brasil: ame-o ou deixe-o” (que significava, como hoje, excluir todo aquele que não comunga a mesma cartilha político-ideológica de extrema-direita), trata-se de uma questão de honra defender o pouco de democracia que conseguimos conquistar. Precisamos mobilizar todos aqueles que, mesmo sem terem vivido os tempos de autoritarismo e repressão (ou que, como eu, ainda adolescente, no interior do país, os tenham vivido sob as mentiras do regime), aprenderam a distinguir os valores que marcam nossa condição humana, na liberdade de pensar e na capacidade de agir em consonância com os princípios de maior justiça e igualdade.
Seja qual for o motivo daqueles que querem nos calar, nossa reação é uma só: defender esses princípios, custe o que custar, lutando permanentemente por uma outra Geografia, uma Geografia da vida que acolhe as diferenças ao mesmo tempo em que promove a união solidária em busca de um mundo de maior igualdade. E onde a ninguém sejam negadas, não apenas as fontes da sobrevivência física cotidiana, mas, também, a liberdade de construir o pensamento, expressar-se criticamente e enfrentar abertamente o debate. Perverso o mundo em que até pela razão e pela ciência temos que lutar. Todo o nosso reconhecimento e solidariedade aos colegas/amigos Ariovaldo e Carlos Walter. Para geógrafos como nós o verdadeiro sentido da vida está no debate franco, aberto, capaz de descobrir ou construir brechas para um “outro mundo possível”, um mundo que proporcione a cada um de nós as condições indispensáveis para a livre manifestação da singularidade de nossos próprios mundos." (Rogério Haesbaert)
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