Fotografias: Luisa Mariano
1 em 1 milheiro, filho da argila e das mãos humanas. Luisa Mariano, resolveu fotografar coisas miúdas, como um tijolo de 8 furos, comum na construção civil.
A pequena fotógrafa fez uma sequência imagética do tijolo modelo, suspenso por restos de fios de cobre encapados em material plástico e restos de fios de varais para estender roupas.
O tijolo é algo concreto, matéria trabalhada. Mas, se suspenso no ar, se transforma em um equilibrista, prisioneiro das finas cordas e assim, trêmula aos rodopios do vento da manhã.
Sobre si, um resto de tesoura, pedaços de caibros e canos de alumínio.
Em uma reforma de nossa casa, foi pouco mais que 1 milheiro de tijolos. Quase todos foram equilibrados em paredes por Seu Naldo, um experiente pedreiro, com mais de 40 anos de ofício.
Entre a tijolada dos dias de trabalho, restou apenas 1. Uma métrica perfeita, pois entre o primeiro e o último, milhares compuseram a obra nas mãos do pedreiro e, apenas 1 não ganhou espaço na construção e, após dias, jogado pelo quintal, virou instalação, ou obra se arte, nas mãos de Luisa Mariano.
Esse jovem tijolo, que já foi barro, argila fina acumulada em sedimentos, que foi arrancado a força por dentes afiados de máquinas, foi amontoado no pátio da Cerâmica de Cachoeira dos Guedes, em Guarabira Paraíba, depois de misturado com água, sovado e jogado nas esteiras da olaria, foi se tornando a matéria prima dos tijolos e telhas.
Depois de tanto amasso, foi moldado em um retângulo com vazios quadrados de aproximadamente 20x10cm e 8 orifícios transversais, foi submetido ao fogo intenso de toras de madeira, por horas a fio.
Depois de esfriado a temperatura natural, integrou uma grande pilha com outros iguais. Uma fornalha com milhares, saiu do forno ainda quente, para compor uma instalação de milheiros, prontos para o comércio.
De mão em mão, do chão para o caminhão esse tijolo começou sua saga concreta e ao entrar no mercado virou mercadoria, um bem durável, porém quebrantável e essencial a edificação de habitações humanas.
Mas por sorte, esse tijolo escapou das mães hábeis de Seu Naldo. Ele até assistiu o triste fim de um "irmão gentil", que, nas garras do trabalhador e na lâmina afiada da colher do pedreiro, foi partido ao meio e se transformou em muro.
Se ganhou vida ou morte, ao se tornar muro, isso fica na subjetividade dos observadores, pois a vida dos tijolos está na vida dos seus feitores, estes estão nas mãos dos seus patrões e com estes, fica a mais-valia relativa, com a compra do tempo de trabalho e a vida dos que produzem tijolos para comprar, minimamente o pão de cada dia.
O tijolo pendurado talvez não tenha cumprido seu propósito, sua missão, talvez não tenha completado a prova ao sair da condição de mais um a compor paredes e muros. Isso não o transforma em um derrotado, em um perdedor ou em um completo "Zé Ninguém".
Por incrível que pareça, virou interesse de arte fotográfica de uma criança, um brinquedo concreto que concretamente adentrou a consciência de uma menina que aguçou seu olhar fotográfico.
Um olhar sobre 1 tijolo pendurado sob cordas, ângulos e retângulo em um trapézio preso por canos em círculos e pontas de fios que presas formam triângulos de um poesia de canto de muro e de fundo de quintal. Se é poesia, não sabemos, mas é concreto e também abstrata, essa arte imaginária de compor fotografias de 1 tijolo prisioneiro.
Um comentário:
Essa "vida" do tijolo e o texto acima é como nossas vidas, fomos nascido, criados, e formados para tal coisa, mas como o futuro é improvável, não sabemos se vamos ou não ser mais 1 tijolo ou seremos o tijolo único que servirá de pensamento para todos aqueles que chegará a ver estas imagens.
Uma coisa é certa, para que viemos não sabemos, mas dependendo das escolhas, assim como esse tijolo não foi escolhido para formar uma parede, pode mudar o destino de tudo...
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