quinta-feira, 7 de junho de 2012

PODERES ESPECIAIS

 
Belarmino Mariano Neto (belogeo@yahoo.com.br )
Para Vitor Hanael de Sousa Mariano, 20 de Janeiro de 2007.
Vítor Hanael estava com apenas oito anos de idade e como as crianças curiosas disse que gostaria de ter muitos poderes. Como pai zeloso e sem lhe perguntar que tipos de poderes, fui logo interferindo e lhe apontando uma chuvarada de poderes que ele possuía.
Disse-lhe que podia: falar, andar, correr, chorar, amar, odiar, pensar, brincar, tocar, cheirar, ver, pegar, refletir, imaginar, sonhar, arquitetar, planejar e assim, fui lhe mostrando que os poderes que ele possuía eram tantos que tinha dificuldade para contar.
Mas Vítor disse que isso não era o poder que ele estava querendo. Ele queria mesmo era poder lançar fogo pelas mãos, voar como as águias, passar por entre as paredes do tempo e viver em outros mundos. Naquele momento, percebi que meu filho estava vendo muita televisão e isso vinha lhe fascinando, lhe desconectando da realidade.
Percebi também que ficara sem argumentos, pois o que ele tinha de mais natural para poder acessar o mundo do qual era parte, não considerava enquanto poder. Parecia algo natural de mais para que se conformasse com o tinha nas mãos, nos pés e no cérebro. Ele na verdade estava diante do grande sonho da humanidade em adquirir poderes especiais e em seu tempo de TV, internet e jogos eletrônicos, os poderes naturais eram insignificantes, diante das possibilidades atribuídas aos super-heróis de plantão.
Estava me sentindo ridículo diante de uma televisão cheia de poderes artificiais que mais pareciam sobrenaturais, interferindo para sempre na formação do único filho que havia gerado. Percebi naquele momento que trazia o poder da criação em minha gênese. Havia arquitetado em pleno gozo de minhas faculdades naturais um filho em toda a sua natureza. Mas o grande problema da humanidade em possuir poderes sobrenaturais motivado pelas imagens do mundo midiático, agora instigava meu filhote. Poderes que foram e ainda são perseguidos pelos místicos, filósofos e teólogos, agora cintilavam em Vítor e nesse momento me veio á idéia de dizer que ele possuía poderes paranormais.
Lembrei que gostava de brincar com ele quando tinha apenas três anos de idade. A brincadeira parecia absurda, mas inventara um personagem engraçado que chamava de “o menino invisível”. Inventara uma voz e quando estávamos brincando o menino invisível entrava nas histórias e eles conversavam horas.
No início da criação desse personagem, Vítor tinha certo medo desse desconhecido menino invisível, mas com o tempo, foi se acostumando e sempre dialogava com aquela criancinha imaginária. O menino invisível tinha a sua mesma idade e as mesmas características físicas. Possuía os mesmos brinquedos e também tinha seus pais invisíveis. Juntos inventávamos cenários perfeitos e ele adora ouvir aquelas histórias de um mundo em que não podiam ver aqueles personagens imaginários.
A partir daquela brincadeira de quatro anos atrás, disse para ele que poder conversar com o invisível era algo sobrenatural. Começamos a lembrar dos outros personagens que também misturávamos as brincadeiras de vozes e histórias. Lembramos do “Velho Quiabo”, um velho maluco que adorava contar histórias do seu tempo de moço. Vítor adorava conversar com o velho invisível que saia da minha boca e expressões faciais. Com aquela velha voz de poeira, misturada com trovoada e palavreados de um analfabeto que inventa palavras.
Vítor lembrou de “H” uma criancinha invisível que tinha menos de um ano e que ainda não sabia nem falar, nem andar direito. Vítor tentava ensinar “H” a falar corretamente. Ríamos deitados em uma rede, com aqueles sons de vozes que ganhavam vida e significado.
Então disse para Vítor que só os paranormais ouviam as vozes do além, do invisível e do desconhecido. Disse que ele poderia ter esse poder e nos seus pré-sentimentos poderia dialogar com o mundo dos sonhos e dos sons. Se ele treinasse mais, iria aumentar seu poder paranormal. Assim ele poderia treinar também a sua clarividência e a sua telepatia.
Vítor ficou fascinado com esta conversa disse-me que quando parava de conversar com ele, que estava brincando sozinho, o menino invisível sempre vinha brincar e teve uma vez que ele chegou a ver seu vulto em um relance de imagens muito suaves em meio a uma fumaça invisível.
Sem perceber, vi que estava tratando com anormalidade de um tema sem fronteiras, pois uma criança com apenas oito anos não seria capaz de entender sobre o sentido sensitivo e sobrenatural da vida. Mas lembrei em seguida que meu pai havia contado que chorou no ventre da mãe e isso lhe dava poderes para prever os acontecimentos e desvendar o mundo dos sonhos.
Lembrei que minha mãe tinha muito cuidado com as crianças, pois dizia que elas ainda estavam com suas moleiras abertas e que era perigoso levar pancadas na cabeça e a moleira também estava aberta para entrada de forças que elas não dominavam. Isso tudo me levou ao mundo da infância, quando não entendia as forças do mundo.
Lembrei dos fogos acesos em fim de tarde e das trovoadas assustadoras e também da grande lua que clareava o céu do sertão. Lembrei que adorava ficar rodando no meio do terreiro, até cair bêbado de tanto rodar. Via um mundo girando, girando, girando como em um carrossel de me mesmo. Via um mundo de nuvens esvoaçantes, de cercas de arame farpado que se misturavam com cercas de pés de aveloz. Rodava tanto que caia no chão de terra batida, via o céu tocando em minha alma, via coisas acontecendo em minha cabeça como se fosse um transe primitivo de memórias ancestrais.


publicado por olharesgeograficos às 02:38

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