Imagem - Pedrinhas, Belarmino Mariano Neto.
Por Belarmino Mariano Neto belogeo@gamil.com
Foi no dia
quinze de junho de dois mil e quatro. Tudo muito parecido com o som do silêncio, um encantamento fora
dos planos, pelo menos dos meus. Uma situação meio que estagnante e/ou mutante
em me encontrar com a maturidade destes três pensadores brasileiros. Gostaria
de esclarecer o estagnante e o mutante, no sentido de pensar que esse encontro
casual e premeditado, aconteceu na Universidade Estadual de Campinas, quando a mesma
se encontrava em GREVE GERAL. Nesse caso, fico pensando que o paradoxo não
significa muito agora.
Tudo foi meio
que por acaso, mas em todo caso isso aconteceu em plena e curta realização de
meus des[a]tinos. É que estou na UNICAMP/SP, em missão de estudos pelo Programa
de Cooperação Acadêmica/PROCAD/CAPES. É uma missão de estabelecer relações com
os sociólogos, antropólogos e outros logos
da UNICAMP. Em especial com o Centro de Estudos Rurais/CERES. Locus que desenvolve pesquisas sobre
"Processos Sociais, Identidades e Representações do Mundo Rural".
Acho bom dizer
como fiquei sabendo. É que ainda sou daqueles que ler cartazes. Vinha de minha Pedalada Zen (bicicleta) para a UNICAMP
e parei para tomar um café orgânico na Lanchonete Macrobiótica (do Tatá), no
Instituto de Filosofia e Ciências Humanas/IFCH. Lá estava um cartaz avisando do
acontecimento e sugestionando um quilo de alimento como forma de entrada. Achei
fundamental essa oportunidade e providenciei o arroz do escambo que pagaria
para ouvir os três cavalheiros e cavaleiros da esperança, poesia e utopia. Acho
que o cartaz destacava o evento para o auditório da Faculdade de Ciências
Médicas e tinha como tema: "Reflexões
sobre a vida e a espiritualidade", com o mediador Walther Castelli, da
editora Verus.
Acho bom dizer
o que faço aqui: Sou doutorando nas Ciências Sociais da Paraíba (UFPB/UFCG) e
pesquiso sobre sociedade e o meio ambiente rural. Venho buscando compreender as
experiências sociais em agroecologia, na Serra da Borborema, Agreste Paraibano.
Bom, mas isso não vem muito ao caso. Só ao acaso de estar aqui para ouvir e ver
de perto estes três palestrantes que a Editora VERUS, reuniu como lavradores de
verdades que muitos queriam escutar, palavras que naquele lapso de realidade
saiam de suas bocas e se espalhavam por um auditório silencioso e cheio de corpus humanus.
Walther
Castelli, acho que um dos editores da VERUS, foi o mediador do trivum de conversas, e, claro o mais
interessado em lançar os livros que estes apresentavam ao público. Ele começa
falando meio que, como intimo dos palestrantes.
Faz uma rápida
apresentação do Luiz Carlos Lisboa, dizendo que o autor de o Som
do Silêncio, é do universo das ciências jurídicas (Direito), mas o que
lhe marca a vida é uma vasta experiência com o jornalismo. "um homem em busca de fatos significativos...". que
reunidos em mais de trinta anos, geraram o livro "Nova Era" e
toda uma produção que consegue fazer som no silencioso universo das palavras.
Confesso que
dos três, o Luiz Carlos Lisboa era o que menos conhecia de seus escritos e fiz
questão de, ao final do evento, comprar o
som do silêncio. Uma coisa simples que em muito me tocou por dentro e por
fora. Um misto de pensamento e convite a meditação, sem pretensões. Meio que
uma busca em compreender ou sentir as coisas como elas são.
Digo que seu
livro é extremamente objetivo. Mas um travesseiro, não só para as horas de
dormir, mas também, para as nossas viagens ou esperas. É um daqueles pequenos
que não pesam, nem cansam a mente. De verdade, gostei da aquisição, pois acho
que o livro reforça meu ideário essencialista.
Sua fala foi
muito curta, meridiana como o som do
silêncio por ele proposto. Consegue despertar uma importância em observar,
mas, acha:
-"fundamental
e preciso conhecer o observador, as suas motivações". Destacando entre outras
coisas “o olhar e o circular em torno de
si mesmo”. Esse é o seu estilo de observador.
Achei o Livro
o Som do Silêncio, simplesmente bom.
O título é um Koan e os pensamentos,
parábolas Zen e asas que circundam suas páginas, nos convidam para as
profundezas do vazio, para quem sabe lá, ouvir o silenciar do som.
Resgato esse
fragmento para deixá-los com vontade de também ouvir o silêncio em sua condição
noturna:
-"Quando a noite pousa sua mão estrelada sobre nossa cabeça,
entregamos o corpo e a alma ao repouso - a esse instante de renovação em que
"não somos". Alguma coisa, no
infinito, continua zelando pela harmonia de tudo" (Lisboa, Luiz Carlos: O
som do silêncio. São Paulo: Verus, 2004)
Walther Castelli, fala um pouco sobre o Leonardo Boff,
relembrando o Frei Beto e o muito que fizeram juntos. Destacou a significativa
entrevista que Boff concedeu a Revista
Caros Amigos, em relação a briga intestina dentro da Igreja Católica e seu
sentimento de profunda tristeza pela perseguição e censura que viveu. Lembrou
que o estado de meditação e contato com a natureza foram fundamentais para
purgar um pouco dessa tristeza e conseguir dar a volta por cima. Que esse novo
livro é um pouco disso, dessa experiência teológica vivida na perspectiva de
uma igreja para os pobres e oprimidos.
Ele destacou que o Leonardo Boff é considerado o mais
conhecido teólogo da libertação, conferencista internacional e professor da
Universidade Estadual do Rio de Janeiro. É emérito professor de Filosofia da
Religião, Ética e Ecologia. Tendo publicado uma boa quantidade de livros nas
áreas de espiritualidade, teologia, filosofia, antropologia e ecologia. Vários
dos seus livros estavam expostos para venda e autógrafos.
Leonardo
Boff, começou lembrando que:
-“Tive que sentar na mesma cadeirinha
que o Galileu Galilei sentou. Isso representou muita tristeza, mas não
amargura, pois amargura resulta em câncer. Esse modelo teológico do catolicismo
romano, tem uma base histórica que se definiu por volta do século III. Base
política para coordenar e legitimar o poder dominante, ajudando a manter o
poder dominante que foi se instituindo com o mercantilismo e que chega aos
nossos dias. Esse modelo deixou de fora os pobres. Na América Latina
reinventamos a igreja. Eu e o Frei Beto, estivemos nesse processo de
"eclesius Genese'', uma igreja de base que começava por outra base - os
pobres da América Latina, África e de outras partes do mundo. Isso tudo passou
pelas pastorais sociais e suas comissões pastorais: da terra, dos índios, dos
negros, das mulheres, dos operários. acho que foi um encontro dos evangelhos
com os pobres e explorados. Essa Igreja da Libertação."
Para Boff, a Igreja é o encontro Fé/vida e um poder
mínimo para que as coisas funcionem. Lembra que essa igreja libertadora
simboliza a continuação de quem morreu na cruz com esse sentido de libertação.
Leonardo Boff lembra que não podemos pensar em uma igreja
que não reconhece as outras, que não respeita as outras religiões. Ele entende
que Jesus é um dos evangelhos e que, assim como existe biodiversidade na
natureza, também deve existir diversidade religiosa que acredite nessa chama
interior e na melhoria da vida para o futuro da humanidade, ajudando a superar
suas dificuldades presentes. Que o evangelho de Jesus é esse que organiza a
libertação do povo e essa é a igreja que ele quer encaminhar.
Apesar de não ser um profundo conhecedor da obra de
Leonardo Boff, sei o quanto seus livros foram importantes e influentes em meu
mestrado sobre ecologia e imaginário, memória cultural e natureza. Ouvir Boff,
ao vivo é meio que uma dádiva. Não querendo mitificar o homem, mas respeitando
aquele que fala de uma terra como pátria mãe da vida e que ao propor uma ética
eco-espiritual, deixa claro a sua posição frente a esse mundo globalizado e
submundializado. Seu pensamento é todo permeado pela esperança de uma
humanidade capaz de superar essa condição historicamente imposta por uma
sociedade capturada pelos códigos de barra da era digital. E, que a
espiritualidade ainda é um caminho.
Walther Castelli fez uma rápida apresentação de Rubem
Alves, esclareceu que o mesmo é de casa, motivo pelo qual estava sendo o ultimo
a ser apresentado nessa conversa. Disse que ele era pedagogo, filosofo e poeta.
Quando professor da Unicamp, realizou importantes pesquisas no campo da
educação. Mas o que queria destacar naquele momento era seu estilo poético do
cotidiano.
Rubem Alves começa dizendo que quando vinha para a
Unicamp, se perdeu literalmente. Era como se não soubesse mais andar nesse
lugar:
-"me perdi
e vi que não era mas desse espaço estranho". Acha que não é mais um homem da academia, pois ver
nesse ambiente um emaranhado de contradições. Acha que só se transformou em
escritor, quando saiu da Universidade, pois pode viver a experiência de
liberdade e de libertação. Podendo escrever do jeito que desejava, sem
preocupações com erros ou coisas desse tipo. Textos pequenos, escritos de forma
simples e ao alcance de qualquer leitor. Ele diz: "Sou um fotografo do cotidiano, escrevo pequenos textos. Acho
que os livros grossos são muito cansativos e prefiro as pequenas
coisas"... "Já disse que se pudesse viver a minha vida novamente,
viveria da mesma maneira que vivi, inclusive com os mesmos erros e planos
fracassados, pois foi através dos meus erros e acerto que cheguei até
aqui"...
Brincou com a sua idade, assumindo os setenta anos,
dizendo que agora ele tinha (60+10), que era sexagenário, e com (70), só setenta.
Disse que a possibilidade da morte torna os olhos mais sensíveis. Acha que em
universidades como a Unicamp, as pessoas terminam não parando para ver as
coisas, é tudo um corre-corre e que não nutre gosto por esse tipo de fazer
acadêmico.
Hoje, muito
mais que antes, ele se preocupa com os detalhes, com as pequenas coisas, com as
flores, com os detalhes do caminho. comentou que não gosta dessa história de
caminhada obrigatória, que só olha para frente e para o relógio.
Lembrou que gosta de literatura, pois é um exercício de
vagabundagem e que ler e fazer amor com os livros, ver as pequenas coisas da
vida. Os sentimentos mais simples. Como Gostar de comer ovo frito bem
quentinho:
-"Gosto de comer ovo frito, pois quando morava em Minas Gerais,
era muito pobre e minha casa ficava próximo a uma estrada de ferro. E via
quando meu pobre pai chegava do trabalho no trem. Eu ficava esperando o trem
que chegava as oito horas da noite, pois meu pai vinha nele. Os trilhos
rasgando fogo, passava pela minha casa. Meu pai
dava com a mão e eu ia encontrá-lo. Lembro que depois que lavava os pés
do meu pai e ele ia jantar: arroz, cebola, tomate, pimentão e ovo frito. Eu
sentava no colo dele e sempre comia um pedaço de ovo frito quentinho. Hoje eu
sei porque gosto tanto de ovo frito."
Diria que o
Rubem Alves é aquele homem de escrituras sagradas sobre a simplicidade do
dizer. Escreve como se estivesse dialogando com forças flexíveis do pensar.
Seus argumentos curtos, em forma de crônicas poéticas nos convidam ao pensar
seriamente a educação, o amor, a arte, a ética e a eternidade do mundo em suas
pequenas coisas. Um dia desses recebi as suas razões do amor pela Internet.
Como é bom ler Rubem Alves. Saber que é possível ver o pensamento fluir como
líquido sagrado das coisas que a mente elabora em brotos de memória e vivência.
Eu estava andando aqui por Campinas e notava
os pés de ipê começando a florescer. Aquele verde dando lugar ao roseado das
flores. Percebi que os ipês daqui são rosados, enquanto que os da minha terra,
lá na Paraíba, são mais roxos, ou lilás. Na minha mente misturei o roxo com o rosa
e cheguei a uma cor magenta. Digo isto pois certa vez, lia uma crônica do Rubem
Alves sobre os ipês florescendo por todos os lugares. É sobre essa simples e
bela realidade que ele gosta de escrever.
Imaginem ouvir
esse camarada ao vivo? Parece tietagem, mas digo que é algo [mais] maior que
isso. É uma profunda admiração por quem me ensina a pensar esse mundo com os
olhos da sensibilidade que é coisa cara aos olhos humanos, frente ao processo
de maquinagem, ao qual estamos sendo
levados.
De VERUS, suas conversas me enchem de
alegria, me ensinam a amar as cores incolores da utopia cotidiana em suas
pequenas coisas. Digo tudo isso aqui dos meus quarentas anos [4.0] de idade,
para os que gostam de tempos turbinados. Escrevo estas palavras com os cabelos
prateados pela lonjura dessa tempera que nos expande no tempo da vida comum de
um aprendiz de ensinador que também sonha em professar sonhos.
Chegamos ao momento das perguntas. Era tanta gente junta
que ficava até difícil pensar se alguém perguntaria alguma coisa. Mas as
questões começaram a ser colocadas para os palestrantes.
Um jovem do curso de Física da Unicamp, que se apresentou
como Fabrício, fez a primeira colocação. Uma gigantesca questão, introduzida
por argumentos os mais diversos. Ele começou questionando o Luiz Carlos Lisboa,
sobre a idéia de observar/observador, dizendo que o simples fato de observar
uma coisa, já interfere no seu sistema. Lembrou que experimentar uma vida, as
ações, movimentos, dizem muito daquilo que não se planeja. Acha complicada a
idéia de fazer calar o som do silêncio.
O professor Leonardo Boff, achou complicada a colocação
do jovem e disse que em se tratando da Física Quântica: "quando você acha que entendeu o fenômeno quântico, você não
entendeu."
Rubem Alves argumentou que os físicos estão sempre
atrasados em relação aos poetas e citou Adélia Prado: "lança erecta, observo". Disse ainda que "o simples olhar de um professor
pode matar a inteligência do estudante."
Outro perguntador, que não se identificou, foi mas breve
e perguntou para os três qual era o caminho?
Boff, foi direto e disse "semear". Ele acha que existe um grande desencantamento do
mundo globalizado (Bush, Bher, Maluf...), mas:
-"o ser humano é um fenômeno quântico pleno para que as coisas se
realizem plenas. Novos encantamentos são criados. Um exemplo é a ecologia, esse
planeta terra, os movimentos, as dimensões do sagrado, a arte e os desafios de
se opor a essa ordem."
Lisboa, falou que:
-"a educação é o caminho. Ir a base e olhar. A educação repetitiva, sem
conclusão e comparativa. A escolha parece repetitiva e emocional. As escolhas
sem conhecimento, só levam a erros. Um exemplo é a violência em escala, começando com minha empregada e chegando até
meu filho. Lembro de Nelson Rodrigues dizendo - olhei para a gravata dele e senti uma inveja homicida."
Rubem Alves não apontou
caminhos, mas lembrou que:
-“nestes últimos vinte anos, muita coisa mudou e acredito muito nas
pessoas que combinam as coisas, sempre valorizando a simplicidade. Ao invés da
palavra Deus, prefiro falar O Grande Mistério".
Uma outra
pergunta foi feita para Leonardo Boff. A pessoa não se identificou, mas
gostaria de saber sobre a Maria dos
nossos dias e um Jesus sem imagens?
Outro pessoa
disse que acreditava ser ateia, mas certa vez encontrou a seguinte frase em um
muro: "NIETZSCHE está morto" (escrito Deus). Ela pergunta se isso
tudo faz sentido e se Marx estava certo em relação a luta de classes, quando se
ver a guerra por petróleo e em nome de Deus?
Um rapaz se identificou como Danilo e fez as seguintes
colocações: 1. "Vejo que existe um significativo crescimento demográfico
de pessoas freqüentando templos religiosos, em especial no Rio de Janeiro, mas,
o que acontece que essa coisa não repercute na realidade, parece que as pessoas
vão a igreja e na volta tudo continua como estava?" 2. "Gostaria de
saber sobre essa história de aceleração do tempo, esse tempo rápido que a gente
não consegue acompanhar?"
Leonardo Boff falou que:
-“Maria é essa mulher que se encontra na luta do dia-a-dia, a mulher
palestina, a Maria que fica indignada com as injustiças. Em toda a história
humana, as religiões produziram conflitos. A espiritualidade é diferente das
religiões, ela produz diálogos. Bush afirma que todo dia conversar com jesus.
Isso é muito perigoso, pois Deus não é da Guerra, Deus é da vida."
Sobre a religião e o aumento
da violência no Rio de Janeiro e em outras partes, Boff, respondeu que a partir
de Marx: "a religião é o ópio, é a
consolação, o que resta. A crítica é importante, mas não podemos deixar de
acreditar no potencial de esperança que existe como um dos últimos sentidos.
Onde há religião, há uma esperança."
Sobre a Ressonância Schumann, Boff, fala de um artigo que
publicou em seu site (http://www.leonardoboff.com/) e que vem
repercutindo entre vários seguimentos da ciência, especialmente entre os
físicos. Ele considera que os desmandos socioeconômicos sobre a superfície
terrestre podem provocar alterações na ressonância do planeta. Ele se lembra de
seus livros sobre a idéia de ecologia profunda e da necessidade de dizer que "o ser humano é a própria terra que
chegou ao estágio de sentir, pensar e amar".
Rubem Alves disse que:
-"essa Maria que Boff fala é mas próxima da Maria dos protestantes
do que a Maria Perfeita dos católicos, essa Maria imperfeita da terra que sofre
com os males praticados contra seus filhos. O Mar, olhar para o mar, assim é o
mistério de Maria. Lá no Chile, Maria é General do Exercito chileno. Esses
deveriam ser excomungados pelo Vaticano.”
Ele acha que o tempo parece mais depressa, esse tempo
fugaz, muito diferente da medida de tempo da criança. Ele acha que tudo parece
muito acelerado e que não se tem mais tempo para nada:
-"Acho que em relação ao tempo, nós construímos as nossas próprias
correntes. Ler alucinadamente, fazer tese é uma espécie de depressão pós-parto,
a gente perde muito da vida, ficamos lendo, lendo e paramos de pensar. Lembro
que uma vez fui participar de uma banca para seleção da pós-graduação e
combinei com os outros membros para direcionar uma só pergunta aos candidatos -
Fale sobre aquilo que você gosta de falar - vimos que os candidatos não tinham
sobre o que falar, travavam, não sabiam o que dizer. Acho que é preciso fazer uma greve aqui na Unicamp contra
o excesso de leitura."
Sobre o Rio, religião e violência, Luiz Carlos Lisboa
disse o seguinte:
-"Acho que a guerra é um macrocosmo e um microcosmo em mim -
quotidianamente a violência está em toda parte - a gente reprime, mas ela
continua em mim. O impulso inibido continua em mim. As guerras que estão no ar,
são e estão também dentro de nós. Temos impulsos terroristas em microescala e
isso é violência em qualquer lugar. Acho que a violência está em mim em tão
grande escala, quanto a da guerra no Iraque."
Na perspectiva de ouvir e anotar acho que muita coisa
deixei passar, mas foi o que pude observar dessas conversas. No segundo
momento, os palestrantes, lançaram perguntas uns para os outros:
Leonardo Boff comentou sobre o livro o som do silêncio, relacionando as idéias escritas com a sabedoria
Zen. Lembrou que existe uma gigantesca biblioteca sobre o amor, mas nem um
livro pode conter o que efetivamente, o amor vivo oferece. Considera o amor
como um estado e isso aparece fortemente no “som
do silêncio”.
Luiz Carlos Lisboa, responde dizendo que:
-“as palavras foram feitas para se referirem as coisas que já existem.
Esse jogo de memória que a gente vai nomeando. Acho que o amor seja algo
impessoal. Essa velha palavra, surrada que cabe em tudo, parece que não
significa mais nada. Esse amor por eliminação, que por descrição fica no vazio
do som do silêncio. Assim penso que, amor é gratuidade e que não é preciso usar
palavras para registrar algumas coisas.”
Walther
Castelli fez uma questão que relacionava o som do silêncio, livro do Lisboa, com
os escritos teológicos de Boff e a experiência mística, destacando a
visibilidade da igreja instituição e a invisibilidade da igreja mística:
Leonardo Boff respondeu que:
-“a vivência é algo intransferível e de cada indivíduo. A igreja
deveria se voltar sempre para o que Jesus nos deixou. ele levantou um sonho e
os seus seguidores lhe pediram um resumo dos ensinamentos. Ele só deixou a
oração do Pai nosso, do pão nosso e do perdão.”
Luiz Carlos
falou sobre os limites aceitáveis da invisibilidade, dizendo que:
-“as coisas se resolvem de indivíduo para indivíduo, mas, quando
voltados para o mundo. O contato e a entrega com o mundo deve ser total. O
encontro, o momento do encontro, a faísca e os impactos do mundo. A tarefa é
nossa, individual e particular. Esse é o estado de ser.”
Em seguida ele perguntou
para Boff sobre os homens que se isolam para meditar e os grupos de homens que
se isolam para meditações?
Leonardo Boff respondeu
dizendo:
-“Sempre tive
o maior respeito pelas ordens contemplativas e já conheci uns três que viviam
só. Conheci um cara que ficava horas velando por Deus, mesmo sabendo que ele
pode não vir falar com ele. Ele contempla e se alimenta dessa força.”
Walther Castell dirigiu a
ultima questão para Rubem Alves, sobre a coisa do silêncio em sua prática de
escrita, e o que diria para os jovens que estão querendo entrar na
universidade, especialmente pela sua estratégia de bufão:
Rubem Alves diz que:
-“Essa
pergunta de Walther me tirou do equilíbrio, acho que terminaria no encantamento
de Boff. Mas como você me perguntou, digo que sou um bufão mesmo. Em meu Leptop, guardo frases sem conexão e as
vezes parece que o conhecimento, a medida que ele aumenta, diminui a sabedoria.
A sabedoria é culinária, essa coisa do sábio/sabor/saborear. O gosto do
torresmo nunca poderá ser dito. Só saborear/sábio/sabor. Diria que são muitas
as teorias educacionais, mas o que gosto é de escrever com humor. Acho que o
corpo carrega duas caixas; uma com os instrumentos ou meios para os nossos
conhecimentos, e uma outra com brinquedos. Muitos acham que essa segunda caixa,
não serve para nada a não ser para brincar. É com ela que gosto de pensar o
mundo e a vida. Acho que Deus faz isso o tempo todo e que esse deve ser o
objetivo da vida, voltar a ser criança. Deus brinca o tempo todo, ele é um
inventor de brinquedos.”
Ouvir
estes três palestrantes foi algo para além das minhas expectativas. Diria que
um misto de descontração e seriedade permearam essa seção de conversas gostosas
de serem ouvidas. Muito das minhas anotações podem não parecer fiel ao que eles
disseram, mas foi o que consegui observar, anotar e arrumar com meus sentidos
para que outros possam também, sentir um pouco do que senti.
Ouvir
Leonardo Boff, ao lado de Rubem Alves e do Luiz Carlos Lisboa me deixou mais
leve para a vida, mas livre para o mundo e mas crédulo para as possibilidades
de humanos conscientes de si mesmos.
Belarmino Mariano Neto, memórias escritos em Campinas/SP, 23 de junho de
2004.
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