quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

A PAISAGEM NO CONTEXTO MULTICULRAL




Grd. Sharlene da Silva Bernardino - Geografia –UEPB/CH – Sharlene_sb@hotmail.com
Prof. Dr. Belarmino Mariano Neto – Geografia – UEPB/CH – belogeo@yahoo.com.br

A paisagem pode ser tomada como reflexo de vários elementos culturais inseridos numa sociedade. Alguns desses símbolos se destacam e acabam por hierarquizar alguns hábitos, fazendo com que os cidadãos que compõem uma sociedade acabem por deixar de perceber a dimensão dos elementos advindos de várias culturas que tornam a cidade, em especial a metrópole, um âmbito de constantes trocas culturais. Este trabalho intensiona observar a importância dos símbolos que constituem e identificam uma paisagem, enfatizando a falta de percepção dos indivíduos para reconhecerem esses elementos no espaço a sua volta. É considerada nesse contexto a importância da paisagem materializada, como também aquela que se constitui para além do poder ótico.


A pesquisa foi realizada a partir da leitura e análise de textos que colocam a paisagem e a cultura como norteadores da identidade social dos indivíduos. Fica evidente que a paisagem acontece de maneira única e veloz tendo em sua composição elementos que advém de hábitos culturais de vários lugares. Diante das pesquisas e análises textuais que se processaram se faz clara a necessidade da compreensão dos elementos culturais que são construtores de uma paisagem mesclada pela multiculturalidade constituinte por um cotidiano que transpassa a capacidade perceptível dos indivíduos que o compõem.
A geografia é uma área do conhecimento que sempre demonstrou preocupação em compreender a relação do homem com o seu meio. Um dos pontos de maior relevância para esse entendimento é a observação e análise da paisagem, já que esta é capaz de retratar as mais diferentes maneiras do individuo relaciona-se com o espaço. Espaço este que segundo Milton Santos (1997), constituiu-se de sistemas que “é formado por um indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como um quadro único na qual a historia se dá”.
Nessa perspectiva, a paisagem pode ser tomada como expressão materializada das relações entre o homem e meio que acontecem num determinado espaço, Wether Holzer apud Londscape coloca que: “a paisagem enquanto elemento geográfico fundamental é vista não só como suporte físico das atividades humanas, mas como palco de um processo interativo onde ela é apropriada pelas culturas que a modifica e lhe introduz novos elementos”. É necessário colocar também que a paisagem é algo para além do visível que se compõe a despeito da interferência humana na funcionalidade dos elementos simbólicos que a desenha. Para Correia (1995):

A paisagem é de um lado o resultado de uma dada cultura que a modela, e de outro, constitui-se em uma matriz cultural (...) muitos de seus elementos servem de mediação na transmissão de conhecimentos, valores, contribuindo para transmitir de uma geração à outra o saber, crenças, sonhos, e atitudes sociais (CORREIA, 1995, p. 4-5).

Assim, a paisagem é concebida pela junção de inúmeros elementos que estão dispostos em um espaço representado por mecanismos culturais que acabam por demandar as ações sociais. Contudo, Laraia (1932 p.80) coloca que “a participação do individuo em sua cultura é sempre limitada; nenhuma pessoa é capaz de participar de todos os elementos de sua cultura”.
Os ditames culturais podem passar de uma geração à outra como já descrito aqui, por Correia, no entanto, a paisagem sofre uma dinâmica constante que para ser percebida se faz essencial está voltado para elementos que requerem uma percepção sensorial, Fernandes (2003) capta essas sensações e as descreve como:

Matérias primas, primeiras e familiares que encontro em um fantástico balé de cores e forma (...) como se essa linguagem visual me detivesse diante dos objetos e me pusesse a diante deles(...)gosto das comidas e bebidas locais(...)essas coisas todas que mexem com os sentidos esse se misturam quando entro em contato com o mundo, estabelecem códigos de afetividade, desenham traços sensoriais dentro de mim. A tudo isso posso denominar de paisagem. (FERNANDES, 2003, p.68-69).

Essa fusão cultural desenhada por elementos que só são perceptíveis por suas cores, sons, cheiros, dentre outras peculiaridades, passa, por vezes, despercebida à sagacidade humana, acontecendo com maior relevância nas grandes metrópoles onde a demanda de serviços e produtos provém dos mais diversos lugares. Ralp Linton apud Laraia traz um formidável texto que retrata de maneira humorada as limitações do individuo para detectar os elementos culturais que permeiam a paisagem a sua volta.

O cidadão norte-americano desperta num leito construído segundo padrão originário do oriente próximo, mas modificado na Europa Setrentional, antes de ser transmitido à América. Sai debaixo de cobertas feitas de algodão cuja planta se tornou domestica na Índia; ou de um linho de lã de carneiro, um e outro domesticado no oriente próximo; ou de seda, cujo emprego foi descoberto na china(...). Ao levantar da cama faz uso dos ”mocasins” que foram inventados pelos índios das florestas do leste dos Estados Unidos e entra no quarto de banho cujos aparelhos são uma mistura de invenções européias e norte-americanas, umas e outras recentes. Tira o pijama, que é um vestiário inventado na Índia e lava-se com sabão que foi inventado pelos antigos gauleses, faz a barba que é um rito masoquistico que parece provir dos sumerianos ou antgo Egito. Voltando ao quarto, o cidadão toma as roupas que estão sobre uma cadeira do tipo europeu meridional e veste-se. As peças de seu vestiário têm a forma das veste de pele originais dos nômades das estepes asiáticas; seus sapatos são feitos de peles curtidas por um processo inventado no antigo Egito e cortados segundo um padrão provenientes das civilizações clássicas do Mediterrâneo; a tira de pano de cores vivas que amarra ao pescoço é sobrevivência dos xales usados nos ombros pelos os croatas do século XVII. Antes de tomar seu breakfest ele olha a rua através da vidraça feita de vidro inventado no Egito(...). De caminho para o breakfest, pára para comprar um jornal, pagando-o com moedas, invenção da Líbia antiga. No restaurante, toda uma série de elementos tomados de empréstimos o espera. O prato é feito de uma espécie cerâmica invetada na china. A faca é de aço liga feita pela primeira vez na Índia do Sul(...). Começa seu breakfest com uma laranja vinda do Mediterrâneo Oriental, melão da pérsia, ou talvez uma fatia de melancia africana, toma café planta abissínia com nata e açúcar. A domestificação do gado bovino e a idéia de aproveitar o leite são originários do oriente próximo, ao passo que o açúcar foi feito pela primeira vez na Índia(...). Acabando de comer, nosso amigo se recosta para fumar, hábito implantado pelos os índios americanos e que consome uma planta originária do Brasil; fuma cachimbo, que procede dos índios da Virginia, ou cigarro, proveniente do México se for fumante valente pode ser que fume mesmo um charuto, transmitido à América do Norte pelas Antilhas, por intermédio da Espanha. Enquanto fuma, lê noticias do dia, impressas em caracteres inventado pelos os antigos semitas, em material inventado na China e por um processo inventado na Alemanha. Ao inteirar-se das narrativas dos problemas estrangeiros, se for bom cidadão conservador, agradecerá a uma divindade hebraica, numa língua indo-européia, o fato de ser cem por cento americano (Ralph LintonapudLaraia, 1932, p.107-108)

A Velocidade dos acontecimentos que moldam a metrópole torna, cada vez mais, a paisagem reflexo de uma multiculturalidade que em certos momentos transita na busca por identidade. Certeau (1986 p.46) descreve “a cidade contemporânea como um labirinto de imagens, onde o comércio liga os desejos às realidades”.
Essa dinamização, que ocorre desde os atos rotineiros acontecidos dentro de um espaço restrito, como os descrito, aqui, por Ralp Linton, podem ganham, ainda mais mobilidade nas ruas das grandes metrópoles. Essa movimentação constante e ritmada velozmente é tema da composição noticias populares da cantora e compositora Ana Carolina lançada em 2006 pela gravadora Sony music. Eis um trecho:

Tomei um táxi um motorista mexicano Veio falando sobre o 11 de setembro. Havia um homem na calçada lendo o código da Vinci ou lia o código da venda. Na parada havia um peruano cheio de badulaques, vendendo, nike, bike, coca- cola light,canivete aceita cheques pros breguetes. Noticias do Iraque na tv da lanchonete (CAROLINA, 2006, CD, SONY MUSIC).

Os símbolos singulares descritos no fragmento desta composição são construtores de uma paisagem abarrotada de infindas culturas compactadas num dado espaço. Para Delfuss (1978 p. 9) “todo elemento do espaço e toda a forma de paisagem constituem fenômenos únicos que jamais podem ser encontrados exatamente iguais em outros locais ou outros momentos”.
Desta maneira, considera-se que a paisagem social é definida e sentida pelos elementos multiculturais que a instituem, no entanto, a dimensão desses símbolos não é absorvida em sua totalidade pelos os indivíduos que a formam e a modelam segundo suas necessidades.
Na ânsia de adequação a um meio que está em constante processo de mutação, mudanças essas que segundo Laraia (1986 p. 96) são dividas em dois tipos “uma que é interna, resultante da dinâmica da própria cultura e uma segunda que é o resultado do contanto de um sistema cultural com outro”, o homem acaba por centrar-se apenas no que considera peculiar a sua cultura esquecendo-se que, a mesma, jamais se constitui de maneira unilateral.

REFERÊNCIAS:


BURQUE, Peter (2003). Hibridismo Cultural. Rio grande do Sul : Ed: Unisinos.

CERTEAU, Michel 1986. A cultura no plural. Ed: Papirus. Campinas São Paulo.

DELFUSS, Olivier (1978). O espaço Geográfico. Ed: Difel Difusão S.A.

FERNANDES, Manoel (2003). Aula de geografia e algumas crônicas. Ed: Bagagem. Campina Grande.

LARAIA Roque de Barros (2003). Cultura: Um conceito Antropológico. 16 ed. Rio de Janeiro: Jorje Zahar.

WERTHER, Holzer. (1996). A Arte da Geografia e os geógrafos humanistas in Revista Fluminense de Geografia (1996). AGB. Niterói, Rio de Janeiro.

CORREIA, Roberto Lobato. (1995) A dimensão cultural do espaço: Alguns temas. In. Espaço e cultura. Rio de Janeiro: UERJ.

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