quinta-feira, 18 de agosto de 2011

A construção social de uma nova agricultura (Resenha)

A construção social de uma nova agricultura 
(Resenha do livro): 
Almeida, Jolcione. rio g. do sul /rs: editora da ufrs, 1999. pp.214


 Belarmino Mariano Neto
Este é um livro que sem sombra de dúvidas aponta para preocupações sociais extremamente novas . Pensa a agricultura , não enquanto uma atividade econômica ou agronômica, mas enquanto um construção social . Sendo assim , o autor divido este trabalho em quatro capítulos :
O primeiro trata do objeto e método , apontando para a idéia de surgimento das contestações . Idéia de ação coletiva e ator social , organização ou sistema social , conflitos e reivindicações.
O segundo trata das formas , origens e os meios das ações : a busca de uma nova agricultura . Atores sociais e lutas , organizações , discursos e práticas . Agricultura alternativa e sensibilidade ecológica . Ecologia científica e agricultura orgânica . Os projetos de diversificação agrícola .
O terceiro trata das ações coletivas e a constituição social ; atores e ações ; modos de leitura do social ; leitura social e busca de identidade ; princípios da agroecologia e leitura essencialista.
O quarto trata da autonomia, estratégias e auto-organização e tecnologias alternativas, fomentadas em especial por ONG's e movimentos sociais no campo.
O autor destaca alguns sentidos para uma idéia de nova agricultura: orgânicos, biológicos, ecológicos ou, simplesmente livres de agrotóxicos. Faz uma relação entre comida (alimento) e veneno, diferenciando "produção limpa" e grande produção (café, laranja, soja) com agroquímicos. Relaciona cardápio tecnológico e custo/benefício e considera as formas alternativas de produção agrícola enfatizando sua dimensão sociológica (sentido/significado). Ainda enfatiza os movimentos sociais que buscam a superação dos agroquímicos e como alternativa propõe os agroecológicos.
Diria que aprofunda o tema dos agroecossistemas, chamando a atenção para o desencantamento do mundo moderno e o reencantamento pelo mundo natural pura e simples; solidariedade entre humanos e respeito a natureza. O paradoxo entre o mundo moderno e os agroquímicos acessados por todos os segmentos sociais e o mundo camponês acessando as práticas agroecológicas.
Como bases teóricas, ver os conflitos e contrastes sociais visíveis – universalização X globalização. Relações econômicas X fragmentação; perda de sentido e falta de respostas positivas da sociedade. Realça a questão da identidade comunitária local e comunidade coletiva internacional; os movimentos sociais que criticam o modelo dominante e apontam alternativas transitórias no sentido da agricultura sustentável.
Os limites e as ações dos grupos sociais alternativos, o conjunto das experiências e as novas formas de viver e ver os efeitos sociológicos das lutas, contestações e dos movimentos sociais no campo.
Mudanças de um modo cultural de desenvolvimento e de um sistema histórico determinado. Liberalismo/neoliberalismo – sociedade de mercado e as expressões sociais, manifestações que seguem no plano cultural e econômico.
A problemática sociológica e filosófica de desintegração da modernidade ou tipos de modernidade... Tipificação de modernidade.
Conceito de crise e espaço social em Habermas (1987). Os grupos sociais oligarquicos e os grupos sociais de ações e solidariedade. Lugar que ocupam e papel que exercem.
Produção e reprodução da vida social. ONG's, associações, comunitarismo, cooperações agrícolas, sindicatos, partidos políticos, correntes da igreja, setores sociais ligados ao mercado tecnológico e ao próprio Estado (agenciamento técnico, econômico e social). Movimentações ideológicas. Pedaços sociais, pedaços culturais. Agentes sociais mobilizadores, interlocutores dos sem voz.
Grupos, associações, organizações (de pessoas e idéias): agricultura alternativa; agricultura orgânica; cooperação de assentados; novo sindicalismo rural e projetos de diversificação agrícola.

Capítulo 1: o objeto e o método:
Apreender sociológico as ações coletivas na multiplicidade e complexidade dos atores sociais envolvidos com a perspectiva da agricultura ecológica.
Significação sociológica: modernidade eliminação do subdesenvolvimento e desigualdades sociais, regula desequilíbrios. O sentido da agricultura moderna; as crises que abalam a sociedade e a agricultura.
Modernidade axiológica: crise agravamento dos problemas, extensão, ampliação.
Ciência técnica, informacional – capaz de superar todos os obstáculos e regenerar o humano ao máximo da civilidade. Melhoramento nas condições de trabalho, abertura cultural e ganhos em renda.
Por outro lado, marginalização e exclusão social, dependência tecnológica e econômica. Dimensão macroeconômica e social; crise internacional dos anos oitenta, crise nas camadas sociais e estágios de miséria; comportamento negativo do desenvolvimento. (pp. 31)
Novas proposições e ações coletivas por uma agricultura diferente, apoiada fortemente nas criticas das noções de modernidade e modernização.
Construção de uma identidade sociocultural e crítica a idéia de crescimento econômico e industrial ilimitados – a bordagem simbólica da leitura social das tensões, problemas da realidade.
Análise simbólica em três níveis : 1) sócio-econômico ou estrutural; 2) dinâmica de organização e modernização; 3) cultural – entre os elementos representativos e os reais.
As ações coletivas e os movimentos sociais – a teoria não fornece respostas apriori .
Atores sociais, suas ações, o lugar e os objetivos – as características próprias e os fundamentos teóricos da abordagem.
(reflexão nossa)
Como estudar comunidades rurais e suas ações sociais e que categorias analíticas utilizar?
Apresentar e discutir o quadro teórico geral e nele realçar as categorias teórico-analíticas essenciais nesta pesquisa?
As categorias e conceitos que são ou estão interrelacionados, considerando que a realidade que se propõe analisar é dinâmica, complexa e interativa, pois trata-se de uma realidade em que privilegia as ações sociais coletivas?
Não pretendo chegar nem sair de impasses teóricos, como os que existem em um bom número de análises e reflexões nessa área, do tipo analíticos clássicos como o marxismo, ou funcionalismo e estruturalismo. Nem sair do dualismo histórico-filosófico que acompanham analiticamente os movimentos sociais com base em crises e contradições estruturais, mas pensar ou refletir sobre se a transição é uma marca da complexidade e dinâmica que admite contradições e crises, enquanto partes correlacionais dos processos e práticas sociais?
O autor considera a teoria de sistemas importante passo na investigação dos processos pelos quais emergem as ações sociais, considerando estas ações coletivas com forte articulação interna, sem no entanto ver os atores sociais, meros e necessários agentes históricos, superadores das contradições criadas pela realidade social sistematizada. Não considera a ação coletiva enquanto força que interfere no equilíbrio do sistema, contrários a ordem social e a tudo que determinam suas instituições políticas e jurídicas. (pp.38)
A soma das ações individuais geram a ação coletiva ou determinado contexto social. Os grupos sociais geram ações coletivas enquanto sujeitos coletivos.
Weber(1971), considera ação como a mobilização de um, de vários ou de numerosos "indivíduos separados" – sociologia individualista.
Touraine (1973), define ação dentro de uma sistema social enquanto uma prática de relação social orientada para a manutenção ou transformação de um ou vários elementos. Ação coletiva enquanto um conjunto de práticas conflituais intervindo em um sistema social.
Melucci (1985), considera ação como uma intricada rede de objetos, de recursos e de obstáculos, como uma orientação voluntária que se constrói em um sistema de oportunidades e restrições. Os atores sociais interagindo a partir da situação em que se encontram.(pp.40)
Organização ou sistema social – relações conflituais entre forças sociais e luta pelo controle do sistema ou modelos normativos. Institucional ou político. O sistema numa conotação particular, visão de conjunto na qual diversas partes interagem de forma interdependente – sistema social como sendo de ação histórica, relações de classes ou político organizacional. (pp.41). Estes são suportes teóricos que o autor utiliza para dar base as suas linhas de reflexões.
Diferente da noção de teoria de sistemas aplicados aos conjuntos naturais ou cibernéticos, em que os reguladores são elementos automáticos. A noção sistema social percebida enquanto construção humana coletiva e contingente, com liberdade relativa dos atores – por mais atraente e tranquilizadora que seja a análise dos fenômenos através de um modelo científico tal qual a teoria dos sistemas aplicados, que as ciências sociais e humanas utilizam amplamente, ela não permite apreender a liberdade e o caráter aleatório dos comportamentos humanos. (pp.41)
A idéia de Social – A natureza do tecido social em termos de poder e resistência que TOURAINE, (1978), admite como uma mistura de dinâmicas e conflitos latentes ou declarados, de dominação, de negociação, de violência e de desordem.
"transbordamentos " do espaço da organização social – vasto território onde os fenômenos, as identidades e as formas de vida pouco institucionalizadas transgridem ou desafiam a ordem que lhes tenta codificar ou submeter. O território do social como espaço da periferia, maior ou menor segundo cada caso, situando-se no interior da organização social, diferenciando-se desta por constituir um lugar de experimentação desterritorializado, espaço de pulsações inovadoras que para ARDITI, (1988) aparece e desaparece de uma hora para outra, sem o controle do poder ou organização social. (pp. 42)
Reflexão nossa : como entender o social sem limites ou contornos exatos, como maior que a organização social? Um espaço mais aberto, sem determinações, nem obrigações. Contradição frágil entre o obrigado e o esforço para sobreviver frente à força do poder? Busca da ordem e/ou rebeldia do social?

O autor afirma que é no espaço ou campo, do social e da organização social e suas interações que se realizam as relações sociais e os conflitos que interessa para este estudo. Interação enquanto um jogo complexo onde se expressa a natureza da ação. Uma trama interativa delimita pelo campo das práticas.
Os conflitos, leituras do social, ação como sentido do agir conflitual. O conflito como uma relação de oposição entre os atores sociais que participam de um mesmo sistema de ação histórica. A ação como o centro da criação de sentidos.
Ações reivindicadoras, ações críticas e movimento social – coletivas e movimentos de luta. O movimento é forte se ultrapassa o limite das suas reivindicações. Se atingem apenas o ponto de equilíbrio são de ação crítica entre a participação e o ataque contra o Estado. (pp. 47)
Movimento social – ação solidária, conduzindo o conflito e ultrapassando os limites do sistema no qual se desenvolve a ação (Cf. Melucci, 1985), transformando as relações de dominação social. Origem na luta reivindicatória, contestação, crise, contracultura.
Crítica ao modelo marxista de luta de classes em relação aos movimentos sociais para complexidade da sociedade, conflito de poder e diversos e correlacionados níveis de hierarquias.
O conflito, manifestações escondidas, disfarçadas, camufladas, anônimas, cheias de armadilhas.
O método considera o processo social complexo, ambíguo e cheio de contradições. Assim o método da observação –interpretação – interrogação, considerando a história dos indivíduos, dos grupos e organizações sociais, o discurso, as representações sociais e as estratégias das ações coletivas que propõem formas novas de fazer agricultura.
Para tal, usou-se critérios empíricos e técnicas entrevistas não diretivas o questionário e a análise do material bibliográfico e documental. Diário de campo, com ficha de campo, acompanhamentos dos grupos e participação de atividades diretas, registro fotográfico, gravações das entrevista foram algumas das técnicas implementadas a pesquisa. O método qualitativo de observação participante, permitiu identificar as diferentes ações "do dizer e do fazer", dos atores sociais em suas visíveis manifestações individuais e coletivas. Com base no método de observação – interrogação, buscou apreender o que os atores sociais "não dizem", ficando escondido por trás dos discursos e práticas sociais. (...) pp. 52.

Cap. 02 – As origens, as formas e os meios de ações :
A busca de uma nova agricultura. Atores sociais e suas lutas. Base histórica a partir da fase colonial...chegando até ao MST e as ONG's de hoje.
O discurso e a prática: as novas palavras e as coisas. "nova agricultura, agroecologia, sustentabilidade..."Esboço de alguns arquétipos alternativos – a sensibilidade ecológica e seus determinantes ( elementos históricos); agricultura alternativa, contracultura e autonomia tecnológica (ecológica, econômica e social); Centro de Tecnologias Alternativas (cetap) – ONGs, 1986...Centro de apoio ao pequeno agricultor (CAPA), ONG's, 1989, Igreja e resistência camponesa no Sul...Centro Vianei de Educação Popular (CVEDP/CPT) anos 80...(...). Associação e Serviços a Projetos de Agricultura Alternativa (AS-PTA/FASE) ONGs... anos 90... condições idéias e base social para base organizacional rural. Agroecologia e base de sustentação política – sindicalismo, consciência e ação política...
Ecologia científica e a agricultura orgânica – base de transformação social para padrões ecológicos "humanista-naturalista" – LUTZENBERGER "Manifesto Ecológico Brasileiro" – visão ecológica das coisas como novo paradigma...pp.96
Associação de Produtores Orgânicos (APRO ) – 1988/RS...; Assentamentos e a cooperação agrícola; sindicatos voltados para produção agrícola; projetos de diversificação agrícola e a bandeira de diversificação...

Cap. 03 – Ações Coletivas e a constituição do Social .
A dessocialização do social; o caráter global e crise do liberalismo pautada no mercado auto-regulador e mercantilização da vida. Dissolução da idéia de projeto social e abertura global da marca do individualismo consumista.
Atores e ações coletivas a (re)constituição do social – crítica ao funcional-estruturalismo; crítica ao marxismo em função da supervalorização do sócio-econômico, dualidade das classes e papel ideológico dos valores por estas teorias não levarem em conta "todas" as dimensões do conflito na ação social coletiva, reduzindo-as a ações patológicas ou marginais. As lutas agora, vistas na ótica do complexo e de outras razões mais específicas, existenciais e de mudança da vida cotidiana...pp. 125
Modos de leitura do social – Constituição simbólico-cultural (de 1-agregações, 2-essencialista e 3-relacional) – 1) idéia geral de mercado, subordinação do trabalho individual ou coletivo à circulação de dinheiro e ao consumo. O agregado coletivo foi quebrado ou dissociado – o mercado assume ou aparece como o unificador social. Daí a idéia de ações e crise econômica. 2- Essencialismo é a leitura das identidades, exclusão e autodefinição dos grupos, comunidades ou "tribos", limites, ruptura e ou violência. Essencialista – origem e concepção do conflito, sua ruptura ou isolamento. Apelo a sua forma mais extrema, a essência a um inimigo ou à utopia total, completa recusa aos princípios gerais diretores. Individualismo ou comunitarismo – dessocialização dos atores sociais e a formação das microssociedades, estáveis, imutáveis...pp.126
Reflexão: nesse ponto, pretendo ver a lógica do cibernético e virtual... da utopia ...
3- o relacional – racionalidade instrumental e científica, ação intencional; a realidade social não transparente; indefinição entre o passado e o moderno, crise de centro de referência e dificuldade de construir o "nós". As relações racionais são capazes de estabelecer uma estrutura dos sistemas de relações sociais e não as relações primitivas ou naturais.
A leitura social de agregados e as relações de adaptação/integração.(pp.128) Os atores pensam suas práticas não como de resistência mais como de sobrevivência física – perspectiva de disputa no mercado e ações de acomodação, conciliação, conflito, integração e viabilidade econômica e social.
A leitura Essencialista do Social e a busca de identidade – critica a modernidade, valorização do tradicional, cultura do comunitarismo, pequenos grupos ecológico-conservacionista, cada vez mais dramatiza o tecido social total, encorajamento para que novos atores constituam uma nova comunidade ou subcultura, nelas reconhecendo a identidade social defensiva e a moral perdida. (pp.140).
Os princípios da agroecologia: rumo a uma lógica relacional do social? – resistência identitária ou sociedade fragmentada em redes restritas de grupos ou comunidades. Ou mesmo integração aos sistemas por participação, ou pela aceitação e mesmo reprodução de uma fragmentação social. Ou criaram um novo tipo de movimento coletivo que vai buscar sair das formas mais ou menos reclusas e de dominação social como um todo. De fato, as proposições agroecológicas ainda são muito restritas, limite aos projetos de fomentação e com frágil nicho produtivo.
Fica a reflexão: É um modelo, pode ser alternativo, portadora em gestação de um movimento social em formação e leva a marca da novidade?

Cap. 04 – Buscando a autonomia – Objeto de reivindicações, organização independente, crise de modelos presentes e contestação.
Autonomia camponesa ou quase autarquia – autonomia e trabalho, tecnologias, profissão, produção ou recuperação da tradição camponesa.
Estratégias para a autonomia; autonomia-solução e auto-organização como objetivo econômico; autonomia política – idéias, experiências e proposições(pp.148-171); Autonomia e tecnologias alternativas: critica contracultural e movimento social.
Reflexão: que idéia, que movimento, que futuro?
Belarmino Mariano Neto . ( belogeo@yahoo.com.br) , Guarabira, 07 de dezembro de 2003
Prof. da UEPB. Doutorando em Sociologia pela UFPB/UFCG.
Melucci (1980_ e Touraine (1984) sociologia da ação coletiva – relações sociais dos atores no sistema.

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